domingo, junho 15, 2008 |
Autor: Ebenézer Teles Borges
A vida tem que fazer sentido. Não posso ser produto do acaso. Meu cérebro – tão complexo e poderoso – não pode ter sido elaborado por combinações aleatórias ao longo de milhões de anos. Definitivamente, não! Tem que existir um artífice que agiu, movido por um belo propósito. Logo, a descoberta desse propósito e o entendimento, ainda que parcial, das intenções desse ser criador pode e deve dar sentido à minha vida. Então, devo buscar por esse criador. Ele existe sim e, em sendo inteligente, deve ser também inteligível. Talvez até me tenha criado exatamente para isso: para procurá-lo, encontrá-lo e, quiçá, estabelecer com ele uma relação familiar na qual lhe serei como filho e ele me será como pai... Não sei por que esse suposto ser criador desejaria estabelecer comigo tal relação, mas não quero e nem posso pensar nisso agora. Tenho outra questão mais importante e já priorizada a ser tratada: encontrar-me com ele o quanto antes e conhecê-lo bem. Não reside nessa busca e nesse encontro o sentido de minha existência?
Claro que sim, responderá prontamente a mente religiosa. A religião, nas palavras de Rubem Alves, "é o esforço para se pensar a realidade a partir exigência de que a vida faça sentido". Exigência? Sim. A religião exige, reivindica como direito, determina, impõe, preceitua e prescreve: "A vida tem sentido! A vida tem sentido! Não estamos aqui por acaso e sem missão. Somos todos importantes!" E a percepção dessa importância nos tranqüiliza...
Contudo, não posso olvidar que a fé religiosa, por mais forte que seja ou pareça, não tem o poder de legislar sobre a realidade. Por conseguinte, é sensato supor que, fora da limitada e confortável atmosfera criada por ela, pode existir um Universo sem coração, indiferente ao drama humano, insensível às nossas dores, que não conspira contra ou a favor da nossa espécie, que não ouve nossas preces e que não veio a existir movido por propósitos e intenções definidos. Talvez não exista um Criador a ser buscado. Talvez até exista, mas não seja condizente com a imagem paternal e bondosa que dele temos. Talvez exista e até seja paternal e bondoso, mas não onipotente e onisciente... Talvez se assemelhe àquele cientista bem intencionado e dedicado, chafurdado em pesquisas, escondido num laboratório, lançando mão de cobaias e conduzindo experimentos que, talvez no futuro, possam trazer-lhe alguma realização ou benefício...
Mas a mim, tal perspectiva se mostra, por demais, desagradável. Não quero aceitá-la. Não vou aceitá-la, porque, com ela, o meu Ego não se identifica. Meu Ego se sente melhor e mais confortável dentro do cenário colorido e planejado, concebido pela visão religiosa cristã. Meu Ego não quer e não aceita ser aniquilado. Exige a existência de algo mais – um outro Universo, um outro mundo, uma outra vida, o mesmo Ego. Meu Ego precisa de um Deus poderoso o bastante para dar-lhe vida e realizar-lhe o desejo de ser eterno e divino. Por conta disso – desse meu insistente egoísmo – ainda não renunciei à velha busca religiosa pelo sentido da vida. Por isso insisto em lidar com o Universo e com a natureza da mesma forma pessoal com que lido com os seres humanos: com promessas, alianças, pedidos, negociações e algumas bajulações – sempre buscando identificar propósito inteligente por trás de cada acontecimento. E me pego fazendo perguntas infantis e tolas. E me vejo a indagar se as tempestades e tornados, os terremotos e maremotos, as doenças e pestes, os nascimentos e mortes fazem parte de algum plano cósmico. E tento encontrar nesse quebra-cabeça confuso um lugarzinho seguro onde o meu Ego possa, enfim, existir em paz, para sempre...
Seria bem mais simples se eu tão somente abrisse mão desse meu egoísmo... Poderia, como recomenda os orientais, despojar-me de minha identidade, relaxar e me deixar perder como uma gota no imenso oceano da existência...
Claro que sim, responderá prontamente a mente religiosa. A religião, nas palavras de Rubem Alves, "é o esforço para se pensar a realidade a partir exigência de que a vida faça sentido". Exigência? Sim. A religião exige, reivindica como direito, determina, impõe, preceitua e prescreve: "A vida tem sentido! A vida tem sentido! Não estamos aqui por acaso e sem missão. Somos todos importantes!" E a percepção dessa importância nos tranqüiliza...
Contudo, não posso olvidar que a fé religiosa, por mais forte que seja ou pareça, não tem o poder de legislar sobre a realidade. Por conseguinte, é sensato supor que, fora da limitada e confortável atmosfera criada por ela, pode existir um Universo sem coração, indiferente ao drama humano, insensível às nossas dores, que não conspira contra ou a favor da nossa espécie, que não ouve nossas preces e que não veio a existir movido por propósitos e intenções definidos. Talvez não exista um Criador a ser buscado. Talvez até exista, mas não seja condizente com a imagem paternal e bondosa que dele temos. Talvez exista e até seja paternal e bondoso, mas não onipotente e onisciente... Talvez se assemelhe àquele cientista bem intencionado e dedicado, chafurdado em pesquisas, escondido num laboratório, lançando mão de cobaias e conduzindo experimentos que, talvez no futuro, possam trazer-lhe alguma realização ou benefício...
Mas a mim, tal perspectiva se mostra, por demais, desagradável. Não quero aceitá-la. Não vou aceitá-la, porque, com ela, o meu Ego não se identifica. Meu Ego se sente melhor e mais confortável dentro do cenário colorido e planejado, concebido pela visão religiosa cristã. Meu Ego não quer e não aceita ser aniquilado. Exige a existência de algo mais – um outro Universo, um outro mundo, uma outra vida, o mesmo Ego. Meu Ego precisa de um Deus poderoso o bastante para dar-lhe vida e realizar-lhe o desejo de ser eterno e divino. Por conta disso – desse meu insistente egoísmo – ainda não renunciei à velha busca religiosa pelo sentido da vida. Por isso insisto em lidar com o Universo e com a natureza da mesma forma pessoal com que lido com os seres humanos: com promessas, alianças, pedidos, negociações e algumas bajulações – sempre buscando identificar propósito inteligente por trás de cada acontecimento. E me pego fazendo perguntas infantis e tolas. E me vejo a indagar se as tempestades e tornados, os terremotos e maremotos, as doenças e pestes, os nascimentos e mortes fazem parte de algum plano cósmico. E tento encontrar nesse quebra-cabeça confuso um lugarzinho seguro onde o meu Ego possa, enfim, existir em paz, para sempre...
Seria bem mais simples se eu tão somente abrisse mão desse meu egoísmo... Poderia, como recomenda os orientais, despojar-me de minha identidade, relaxar e me deixar perder como uma gota no imenso oceano da existência...
Resisto firmemente a essa sugestão. Sou egoisticamente apegado à busca religiosa, o que me leva a perguntar se meu grande inimigo é esse tal Diabo, a quem nunca vi, ou se é esse Ego teimoso, o qual nunca deixei de ver...
5 comentários:
Excelente texto, pena que raramento temos, em função do seu escasso tempo.
Penso, porém, que o ego ignorante é o mais feliz: afinal a ignorância não é fator de felicidade?
SDS
Ebenézer,
Pobre da mente religiosa. Busca a vida eterna motivada pelo egoísmo, mas é justamente esse sentimento que lhe condena à morte.
Se existe um Deus, tenho pra mim que serão justamente os que menos esperam estar ao seu lado eternamente os que alcançarão essa "graça”.
Este foi um dos textos mais inteligentes que já li. Simples, porém de uma genialidade ímpar.
Porém, ainda me questiono se pretender que a vida tenha algum propósito ou faça algum sentido seria mero egoísmo ou um simples anceio natural inerente a toda criatura racional.
Concordo com a possibilidade da realidade ser nua e crua, mas na completa falta de provas conclusivas também considero a possibilidade dela não ser.
Alguns podem dizer que considerar é pouco, nós torcemos para não ser. Sim, devo admitir que não só considero como também torço.
E que mal há em torcer? Não torço pelo meu time de futebol por ele ser o meu preferido entre os outros? Então porque não posso torcer para a possibilidade que mais me agrada?
E mesmo que um dia fique inquestionavelmente comprovado que a vida não tem nenhum propósito além do simples nascer, viver e morrer, assim mesmo eu, no fundo do meu coração, anelaria que tudo fosse bem diferente.
"Concordo com a possibilidade da realidade ser nua e crua, mas na completa falta de provas conclusivas também considero a possibilidade dela não ser."
Cleiton, já está provado cientificamente que a morte é o fim de tudo (rs). Já fizeram esse experimento com centenas de milhões de pessoas, e nenhuma voltou para contar história. Me desculpem os espiritas, mas eu não acredito em vocês. Também não acredito em fantasmas e afins.
Não sei como você pode dizer que existe uma "possibiliadde da realidade ser nua e crua". É óbvio que a realidade é nua e crua.
Ricardo, meu amigo, seu dogmatismo às vezes me assusta (rs).
Já dizia Shakespeare: "Há mais mistérios entre o céu e a terra do que supõe nossa vã filosofia".
Quanto ao sobrenatural existir ou não, também tenho cá minhas dúvidas. Quanto mais pesquiso sobre mágicas, mais percebo como é fácil lubridiar os pobres seres humanos.
Por outro lado, já que a realidade é "nua", ainda bem que ela é do gênero "feminino". E já que é "crua", pelo menos a gente para um pouco com estes industrializados que só fazem mal.