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domingo, setembro 11, 2011 | Autor: Ebenézer Teles Borges
Dias marcantes se diferenciam dos demais nem sempre por serem bons ou especiais. Com freqüência, ficam registradas em nossa memória por conterem cenas fortes, inusitadas e até mesmo trágicas e amargas. Tais dias se tornam inesquecíveis, por mais que os tentemos apagar de nosso registro mental.

11 de setembro de 2001 foi um desses dias que começam e nunca terminam. Aqueles que o viveram por certo nunca o esquecerão. Para esses, as torres continuam incandescentes, fumegantes e desabando sobre os sonhos que acalentamos de viver em um mundo melhor, de paz e harmonia entre os povos.

O 11 de setembro nos lembra que somos uma espécie belicosa!

Engendramos armas, construímos trincheiras e convocamos guerra: tudo isso em nome da paz! Elaboramos crenças, inventamos deuses, erguemos templos e invocamos cruzadas: tudo isso para promover a paz e a concórdia... Não consigo entender!

Queremos um mundo melhor para todos, mas nos recusamos a rever nossos conceitos. Estamos convencidos de que o mundo melhor para todos é aquele que concebemos em nossa cabeça e organizamos em forma de crenças, em nome das quais nos dispomos a lutar, a brigar e até mesmo a morrer e a matar.

Quanta tolice, irracionalidade, falta de compreensão e de respeito pelas diferenças.

Lá se vão dez anos. Novas torres estão sendo erguidas e, possivelmente, em algum lugar sombrio, planos sinistros estão sendo arquitetados para pô-las abaixo.

Assim caminha a humanidade!
quinta-feira, fevereiro 24, 2011 | Autor: Ebenézer Teles Borges

A correria da vida tem me privado de tempo para pensar. Sou um ser pensante, ou pelo menos deveria ser. Tenho sido um "pensante não praticante". Ultimamente tenho abusando do piloto automático. De casa para o trabalho, do trabalho pra casa. E entre uma coisa e outra, longas e enfadonhas horas no trânsito neurótico de São Paulo.

Tenho tomado, à cada manhã, a pílula da condescendência com essa realidade mórbida e, sob seu efeito, passo a encarar os fatos como "normais". Sigo, ao longo do dia, sonolento, entorpecido, distante... até que um fato novo se encarregue de me despertar. E foi isso que aconteceu. Nos últimos dias fui tocado por dramas vividos por colegas de trabalho e familiares diante do inexorável, do inevitável: A morte.

O tempo passa para todos e leva consigo a beleza da forma, o vigor da juventude e, por fim, a própria vida. A morte mora ao lado. Segue-nos como sombra. Está sempre em nosso encalço e se aproxima perigosamente à medida que o tempo de vida avança. Por fim ela sempre nos alcança, abraça, envolve, aniquila.

Começamos a morrer assim que nascemos. Contradição insuperável: a vida traz em seu cerne a semente da morte! Essa semente brota, cresce e se faz árvore, cujas sombras densas nos cobre.

Dizem que a única certeza absoluta que se pode ter é que a vida terá um fim, cedo ou tarde. Há os que acreditam que é dessa certeza indigesta que brotam os delírios da imortalidade e as crenças na ressurreição do corpo, na imortalidade da alma, na vida após a morte, ou algo do gênero. Faz sentido?

E eu que seguia embalado pela rotina - meio vivo, meio morto - fui chacoalhado por sinais vindos de vários lados alertando-me para o fato de que é preciso viver de forma plena.

Pois é... Hoje, antes de ir dormir, resolvi resgatar minha capacidade (quase perdida) de pensar. E pensei. E me dei conta de que o tempo está passando e a vida se desbotando. É preciso viver!
sábado, janeiro 22, 2011 | Autor: Ebenézer Teles Borges
A frase acima, usada como título para esse texto, é de autoria do cantor e compositor John Lennon e é citada por a Richard Dawkins no documentário "A raiz de todo mal" e no livro "Deus um delírio", nos quais ele argumenta com fervor e eloqüência em defesa de um mundo sem ataques suicidas, sem o 11 de setembro, sem o Talibã, sem as infindáveis guerras entre judeus e palestinos, sem muçulmanos, sem cristãos, enfim, um mundo sem religião. Você é capaz de imaginar como seria esse mundo? Eu bem que tentei imaginá-lo, mas me esbarrei em algumas limitações.

Até onde consegui pesquisar, não se tem conhecimento de nenhuma cultura que seja estruturalmente não religiosa ou atéia. Com efeito, ao longo dos séculos, o ateísmo foi sempre um fenômeno escasso, minoritário, periférico. Imaginar um mundo sem religião estando inserido em um mundo essencialmente religioso requer muita abstração e criatividade, a menos que tomemos um atalho e peguemos o nosso mundo, tal qual é, e simplesmente removamos a religião dele. Essa atitude, contudo, não me parece ser a forma mais honesta de lidar com a questão, mas foi o que eu fiz (e penso que seja o que muitos façam) ao aceitar o desafio de John Lennon em sua música "Imagine".

Para muitos, o mundo seria melhor se não houvesse religião. Alguns, pela forma como se colocam, parecem ter certeza disso. Sinceramente, não sei como chegaram a essa conclusão, mas não quero aqui polemizar sobre o que me parece ser resultado de escolhas pessoais. Quanto a mim (e aqui exponho tão somente meu ponto de vista numa reflexão sabática despretensiosa), estou inclinado a crer que a religião não seja a raiz de todo o mal, porque, para mim, religião não é "causa" e sim "efeito". Conseqüentemente, sua remoção não seria suficiente para o estabelecimento de um mundo novo e melhor, já que a verdadeira causa permaneceria.

É fato inegável que sempre houve atritos, conflitos e guerras baseados em princípios religiosos. Reconheço que, em nome de Deus muitas atrocidades foram cometidas. Lembro-me agora, para citar um exemplo, das Cruzadas que, sob o pretexto de reconquistar a cidade de Jerusalém – local sagrado para os cristãos – legitimou crueldades, saques, destruições e mortes, deixando um rastro de sangue ao longo de quase dois séculos de história (1096-1272). E tudo isso conduzido sob as bênçãos da igreja e, supostamente, com a aprovação do "Senhor dos exércitos, o Deus de Israel". Confesso-lhes que, ao refletir sobre esse capítulo sombrio de nossa história, sinto-me propenso a pensar que o mundo sem religião seria melhor que este em que vivemos.

Por outro lado, admito a existência de um outro lado da experiência religiosa que me faz hesitar em colocá-la no cadafalso. São casos como o do quase desconhecido frade franciscano Maximiliano Kolbe, que se voluntariou para morrer em lugar de um pai de família no campo de concentração nazista de Auschwitz. Durante a segunda guerra mundial ele abrigou muitos refugiados, incluindo aí dois mil judeus. Relatos como esse me comovem!

A religião, no entender de especialistas, é um fenômeno "polissêmico". O que isso significa? Essa palavra, pouco usada em nosso dia-a-dia, deriva do grego "poli" (muitos) e "sema" (significado) e é empregada pelos estudiosos da religião para dizer que ela é um signo aberto, que pode assumir significados diversos de acordo com o contexto e ser usada para praticamente tudo. Em nome da religião estimulou-se a inquisição e a caça às bruxas; em nome da religião promoveu-se a arte e a poesia. Em nome da religião se mata; em nome da religião se salva. Em nome da religião, tudo pode ser justificado. É isso que os especialistas querem dizer quando se referem a ela como "polissêmica".

Quando analisamos os textos sagrados nos quais as religiões se alimentam, fica mais fácil entender esse comportamento metamórfico que as caracteriza. Tomemos o cristianismo como exemplo, apenas por ser essa a religião com a qual temos maior afinidade. Em certa ocasião, Jesus disse que não veio ao mundo para trazer paz e sim espada (leiam em S. Mateus 10:34-36). Em outro momento ele afirma o contrário. Diz ele: "bem-aventurado os pacificadores" (leiam em S. Mateus 5:9). Afirmações como essas, aparentemente conflitantes e incoerentes, abrem margem para interpretações dúbias, divergentes, contraditórias, antagônicas. Qualquer um pode se sentir no direito de invocá-las ou interpretá-las em benefício próprio ou conforme a conveniência do momento, justificando assim tanto a guerra (por motivos "nobres", sempre) quanto a paz. Atualmente, presenciamos uma explosão de novas denominações religiosas cristãs, cada uma com suas singularidades e incongruências e todas ancoradas no mesmo texto sagrado. A natureza polissêmica desse texto sagrado favorece (e até justifica) esse fenômeno bizarro.

Com base no que foi colocado até aqui, parece-me razoável presumir que a religião, por ser polissêmica, isto é, aberta e sujeita a interpretações circunstanciais e influências pessoais, pode ser usada (e de fato tem sido usada) para apoiar movimentos que promovem tanto a paz quanto a guerra, tanto a concórdia quanto o conflito, tanto a vida quanto a morte. Ora, isso me leva a concluir que a religião em si não passa de um instrumento, que pode ser usado (e de fato o é) de acordo com a habilidade de quem o domina. E em sendo um instrumento, então não pode ser "a causa" do bem ou do mal, porque não há intenção em um instrumento.

Se me permitem a comparação, o mesmo pode ser dito a respeito da ciência. Ela também é um instrumento, uma ferramenta e, como tal, seu propósito é o propósito de quem a utiliza. Há quem faça bom uso da ciência, mas há também quem não o faça. Após a segunda gerra mundial, muitos se perguntavam se ainda era possível acreditar em Deus depois de Auschwitz. Por outro lado, outros também se questionam se ainda era possível acreditar na ciência depois de Hiroshima.

Não sei se estou conseguindo ser claro, mas o que estou tentando dizer é que, assim como a ciência, a religião não deve ser tomada como a "causa" de certos males que afetam nosso mundo e concluir que, sem ela, estaríamos mais próximos do paraíso terrestre. Isso porque, no meu entender, a verdadeira causa de tais males precede a própria manifestação religiosa.

Evidentemente, o que expus aqui é apenas o "meu" ponto de vista atual. Sei que muitos discordariam dele se porventura viessem a ler o que acabo de escrever. Por isso e de antemão, registro aqui meu sincero respeito e apreciação por essas opiniões contrárias. Contudo, reafirmo o que disse e que resumo da seguinte forma:

(1) O sentimento religioso é inerente ao ser humano. Conforme disse antes, não se tem conhecimento de qualquer cultura que seja estruturalmente não religiosa ou atéia. Em sendo assim, não consigo imaginar como seria um mundo sem religião, a menos que imagine um mundo sem seres humanos. Se a religião não existisse, nós a inventaríamos, talvez com outro nome, mas com essência semelhante.

(2) Entendo que os problemas que existem na sociedade são decorrentes da natureza humana. Somos seres belicosos, sedentos de poder e essencialmente egoístas. A própria sociedade (que também é uma invenção humana) se apóia nesse nosso egoísmo (aprendemos com o tempo a impor limites a esse egoísmo em troca de um bem maior). Em sendo isso verdade, então, com religião ou sem religião, continuaríamos a ser o que somos: egoístas, violentos e ávidos por poder.

E depois de tanto falar a pergunta persiste. Hipoteticamente falando, o mundo sem religião seria melhor ou pior do que este em que vivemos?

Não me parece que seja possível responder a essa pergunta de maneira honesta. Faltam-nos elementos para análise. Podemos fazer suposições. Podemos eleger uma das opções como preferida e elencar características positivas e/ou negativas para apoiar nossa escolha, mas o fato é que só conhecemos um mundo – o mundo com religião – e o outro não passa de uma hipótese ou utopia.

Julgo importante lembrar que, na maioria dos casos, as utopias são elaboradas não com o fim de se criar um novo mundo ou uma nova sociedade e sim reformar o mundo e a sociedade em que vivemos. Em sendo assim, vale à penas considerar a proposta de John Lennon e tentar imaginar como seria esse mundo sem cristãos, muçulmanos, budistas e outros rótulos religiosos que causam tantas divisões. Talvez esse exercício nos ajude a melhorar o mundo que conhecemos, a começar por nós mesmos.

E para concluir o tema, evoco as palavras do historiador e filósofo Dr. Leandro Karnal, professor na Unicamp, em um Café Filosófico que não canso de assistir: "Volto a insistir: ateísmo ou religião não tornam o mundo pior ou melhor, apenas tornam o mundo do jeito que ele é".
domingo, junho 06, 2010 | Autor: Ebenézer Teles Borges
Aprendi a confiar em Deus e a desconfiar do homem. Isto porque Deus é perfeito, ao contrário do homem que é falho por natureza. E em sendo a ciência uma invenção humana, esse raciocínio me levou a desconfiar da ciência também.

Mas não me parece que essa desconfiança seja ruim. É bom desconfiar da ciência, e explico-me: Assim como ocorre com o ser humano, a ciência não tem propósito. Isso mesmo. A ciência, em si mesma, não tem propósito. Ela é uma ferramenta e o seu propósito é o propósito de quem a utiliza. Há quem faça bom uso dela e há quem não o faça. E como aprendi a desconfiar das intenções humanas, sou levado a desconfiar da ciência que eles fazem.

Além disso, é comum a confusão entre "fazer ciência" e "possuir titulação acadêmica". Ciente disso, a mídia explora a figura de médicos e profissionais qualificados em comerciais que promovem creme dental, shampoo, sabão em pó e seja lá o que for. Nesses casos, o que se tem em vista não é a divulgação da ciência e sim a exploração da confiança cega que grande parte da audiência deposita nela para vender um determinado produto. Essa estratégia parece funcionar, a julgar pela quantidade de comerciais que exploram essa abordagem. E ela só funciona porque muitos confiam na ciência, sem sequer saber a distinção entre um médico e um cientista. Por essas e outras, continuo desconfiando da ciência, por desconfiar dos homens que a usam e manipulam como instrumento de trabalho.

E deixando de lado o uso (às vezes inapropriado) da ciência enquanto ferramenta de trabalho, é importante lembrar que a ciência só funciona porque não se confia nela. Pode parecer paradoxal, mas se confiássemos na ciência não faríamos ciência e sim religião. Religião é a arte de confiar; ciência é a aptidão para a desconfiança. E por não confiar, a ciência exige provas e não fé. A confiança é demasiadamente passiva para levar ao esclarecimento.

Mas confiar é preciso!

De certa forma, foi a confiança que tornou possível a civilização. Precisamos confiar no diagnóstico do médico que nos examina e na opinião do mecânico que revisa nosso carro. Não dá para saber tudo sobre tudo, então, a alternativa viável é confiar. E se confio em alguém, aceito o que ele me diz como sendo uma verdade. O problema desse sistema baseado na confiança é que posso ser induzido a equívocos, ainda que a pessoa em quem deposito minha confiança não seja mal intencionada. É como dia a Bíblia: "maldito o homem que confia no homem" (Jeremias 17:5).

Desconfiar também é preciso!

Mas fazer ciência não é desconfiar por desconfiar. A ciência segue um método, ou melhor, vários métodos, mas todos eles embasados em duas características comuns: o empirismo e a crítica (a tal desconfiança permanente). Por que o céu é azul? Por que, ao soltar um objeto, ele cai em direção ao solo? É o sol que se move ao redor da terra ou o contrário? Por que existe algo e não o nada? E o cientista observa, coleta informações, conduz experimentos, coleta dados, tenta reproduzir os mesmos efeitos em laboratório, acata e descarta hipóteses e segue em busca de respostas.

Recomendo que desconfiem da ciência, pois ela é falha. Lembrem-se de que algumas verdades científicas perderam esse status diante de novos avanços da própria científicos. É a ciência sendo usado como instrumento para se corrigir e melhorar. Ora, se ela fosse perfeita, não precisaria de correção, não é mesmo? Com efeito, em determinadas áreas do saber, parece-me difícil afirmar que a ciência chegou ou chegará ao pleno conhecimento da verdade. Ela está sempre se aproximando...

Recomendo que desconfiem da ciência, pois ela é imperfeita. Mas, justiça seja feita, ela é o melhor que o gênio humano conseguiu elaborar para compreender este universo do qual fazemos parte. Desconfio, sim, da ciência, mas aprendi a admirá-la e vou lhe dizer o por quê.

Nós temos hoje uma vida que, há duzentos anos, não era sequer sonhada por reis e rainhas: automóveis, aviões, casas confortáveis, computadores, telefonia celular, internet, produtividade no campo, medicina avançada e por aí vai. Em decorrência disso, a expectativa de vida vem subindo gradativamente e a qualidade de vida também. Isso se observa a cada nova geração: eu vivo hoje em condições mais favoráveis que meu pai, quando ele tinha a minha idade. É a ciência promovendo a vida humana.

Mas há quem pense de forma diferente. Há quem queira intervir dizendo que a ciência tornou possível a bomba atômica. A esses eu afirmo que, infelizmente, a política e os políticos não conseguiram acompanhou o avanço da ciência, o que é uma pena...
sexta-feira, junho 04, 2010 | Autor: Ebenézer Teles Borges
Estabeleci duas metas para mim neste final de semana prolongado que teve início ontem, com o feriado de Corpus Christi: Correr pelo menos quarenta quilômetros e publicar pelo menos quatro textos em meu blog.

A primeira parte está indo bem: ontem corri 12 Km, hoje 15 Km e no domingo correrei os 13 Km que faltam. Alcançar a segunda meta, porém, não vai ser nada fácil. Estou sem disposição para escrever. Mas como promessa é dívida, preciso pelo menos tentar. E já que ontem foi feriado (bendito feriado!!!), vou tentar encontrar nele inspiração para redigir alguns parágrafos.

A motivação religiosa que deu origem ao feriado de Corpus Christi é a celebração da presença real e substancial de Cristo na Eucaristia, um dos sete sacramentos da igreja Católica. Fiz questão de salientar em negrito essas duas palavras porque, no entender dos pais da igreja e de seus herdeiros que residem no Vaticano, ao participar desse rito sagrado, o fiel não está provando de mero pão e vinho e sim alimentando-se do próprio corpo e sangue de Jesus. Se tal milagre acontece de fato, então é justo afirmar que os fiéis (cientes ou não) estão participando de um rito macabro, que pode ser classificado como antropofagismo e, talvez, vampirismo.

Toda essa confusão de deve à interpretação de uma frase pronunciada por Jesus durante da celebração da última ceia com seus discípulos. À certa altura, Jesus disse em tom solene: "...tomai e comei, este é o meu corpo... tomai e bebei, este é o meu sangue." (Mateus 26:26-28). Pronto! Os pais da igreja interpretaram esse texto ao pé da letra!

Penso que a maioria dos brasileiros que se identificam com o católicismo não está nem aí para essa interpretação literal. A maioria não acredita nesse milagre que transforma pão em carne humana e fiéis em canibais. A maioria não tem tanta fé assim. Para estes, a afirmação de Cristo não passa de uma metáfora. (OBS: julgo importante lembrar que, para os cristãos protestantes, as palavras de Jesus foram, de fato, metafóricas, simbólicas).

Seja como for, o lado bom dessa história é que, graças a ela, ganhamos esse feriado religioso, cujo significado interessa a poucos, mas que nos rende um belo e longo fim de semana de folga. Então, exclamemos todos: "Bendito Corpus Chisti", ou, como se diz na língua dois pais da igreja: "Corpus Chisti beatus est", ou algo parecido.

Bom e longo fim de semana a todos!
domingo, maio 16, 2010 | Autor: Ebenézer Teles Borges
A propósito do artigo "Sobre a vida após a morte..." publicado no site "Convictos ou Alienados", achei por bem colocar aqui minhas impressões: renascer após a morte do corpo, sobreviver ao decaimento da matéria, viver eternamente no tempo, tem sido um sonho da humanidade. De certa forma, somos todos Ponce de Leon em busca da fonte da eterna juventude.

Nesse aspecto não me diferencio dos demais. Cresci acreditando em vida eterna num paraíso encantado onde todos se vestem de branco, tocam harpas e não se cansam de exclamar "Aleluia"! Um lugar onde não há dor, morte, perigos, riscos ou qualquer tipo de ameaça. Um lar de paz...

Paz? Sim. Paz para sempre. Nenhum conflito, nenhuma desavença, nenhuma intriga, nenhuma divergência, nenhuma discordância... Será que eu seria feliz vivendo eternamente em tal lugar? Não sei. Tenho cá minhas dúvidas. Às vezes me parece que viver eternamente possa não ser tão bom quanto costumamos supor. E me sinto tentado a imaginar que até os maiores defensores desse viver sem fim, depois de alguns séculos ou milênios, começariam a se sentir incomodados pela paz inabalável e quietude rotineira desse lugar e passariam a entender melhor o significado da palavra "tédio".

Vida eterna nesse paraíso implica em ausência de risco, e não posso negar que, aos meus olhos, os riscos são ingredientes indispensáveis ao tempero do existir, diferenciando fatos comuns de eventos marcantes, inesquecíveis.

Além disso, na economia da vida (desta vida que é a única que conhecemos), o valor das coisas está associado, em parte, ao seu grau de escassez. Ouro e diamante têm grande valor porque não existem às pencas como seixos e cascalho. De igual modo, essa vida que temos é ouro e diamante justamente por ser curta e fugaz. Cada dia vivido nos aproxima do fim inevitável. Cada passo que damos nos conduz à morada do silêncio, à terra do esquecimento, aos braços da morte. Sabemos disso. Sabemos que a vida não é eterna e nos apegamos a ela com unhas e dentes, dando-lhe o valor que, de fato, ela merece ter. A morte torna a vida preciosa!

Gosto de viver, a despeito das dores e dissabores que fazem parte do meu existir. A grandeza do universo e a inocência de uma criança são exemplos de fenômenos que me encantam e emocionam. E há tantos outros mistérios que gostaria de desvendar, tantas experiências inusitadas que gostaria de vivenciar, tantos caminhos que ainda desejo percorrer... Meus dias são tão curtos, tão breves, tão insuficientes para me ensinar tantas lições, que às vezes me pego dominado pelo sentimento irracional de revolta, de ódio contra sei lá quem ou o quê. E me vejo perguntando: Por que a vida é assim, tão injusta, tão curta? Por que vivemos tão pouco? Que são 40, 70 ou 100 anos de vida quando comparados aos milênios de história da raça humana?

Quero viver mais sim, admito, mas isso não significa que deseje viver para sempre. Temo os superlativos e costumo evitar o uso de palavras que expressam o absoluto, tais como "sempre", "todos", "eterno" e outras do gênero. Quero viver mais. Quero viver muito. Quero viver o suficiente para poder afirmar: "já vivi o bastante". Admito o meu receio de viver eternamente...

Curiosamente, as religiões ensinam que nosso maior inimigo é o EGO. Aprendi essa lição quando criança, embora, naquela época, não a tenha entendido. Ego? O que é isso?

Ego, penso eu hoje, é esse algo que insiste em ter, em ser, em estar, em viver eternamente... No dia em que conseguirmos nos desprender dele, como recomendam as religiões, sobrará algo que possa desejar viver eternamente?
sábado, abril 10, 2010 | Autor: Ebenézer Teles Borges
"Prosa" é o que se elabora ao digitar textos iguais a este, organizados em parágrafos e sem nenhuma divisão rítmica intencional. "Poesia", por outro lado, é a arte de usar a linguagem humana com fins estéticos; de dar a elas nuanças sublimes - difusas, mágicas - que as fazem transcender seu significado literal e as capacitam a expressar aquilo que as palavras, por si só, não conseguem dizer.

Gosto de escrever em prosa, sabem por quê? Porque é a único modo em que consigo escrever! Gostaria de saber me expressar em forma de poesia! Gostaria... Mas esse dom me foi negado; essa habilidade, infelizmente, não consegui desenvolver... Até tentei, sem êxito, porque, como assevera a sabedoria popular, "o poeta nasce..."

Contudo, essa minha limitação não me impede de apreciar a sonoridade métrica de um verso, nem me desencoraja da busca pelo significado abstrato que se funde e confunde com sua forma concreta.

É fato que, nem sempre consigo interagir com uma poesia como, suponho, se deve fazê-lo, isto é, por meio do coração. Quase sempre me deixo influenciar pela cabeça pensante e permito que a razão se interponha como elemento mediador. E ao usar esse filtro, a magia se desfaz. E grande parte da arte se esvai. E os segredos se mantêm velados. E os mistérios permanecem ocultos. E a beleza perde o encanto. E o ler poesia se torna mais pesado do que o ler um jornal especializado em economia...

Em tempos tão corridos, ler prosa tem-se mostrado mais prático e eficiente do que ler poesia. Poesia requer atenção, concentração, sensibilidade, entrega, dedicação, abstração, reflexão e tempo. E quem, hoje em dia, tem tempo para poesia?

Ah! Mas hoje, sábado. E neste hoje, encontrei um tempinho para apreciar uma poesia de inspiração religiosa, que encerra em seus versos tal profundidade e beleza que eu, com minha prosa inculta e insossa, nunca serei capaz de expressar...

E me percebo acometido por um dos sete pecados capitais: a inveja! Como gostaria de ser poeta! Como gostaria de ter esse dom! Como gostaria de ter sido eu o autor de tão bela obra de arte! Como gostaria de... Opa! "Para trás, Satanás"!

O que transcrevo, abaixo, é poesia, pura poesia: arte de dizer o indizível, de dar forma ao informe; de tocar o intocável. E por mais que eu multiplique aqui minhas débeis palavras, não conseguirei transmitir o que essa poesia, em sua simplicidade e beleza, consegue expressar... porque não sou poeta, não tenho alma de poeta, não aprendi usar palavras para superar as limitações e incongruências inerentes às palavras. Resta-me, então, resignar-me em silenciosa admiração - estático e extático.

Faço-lhe um convite: aprecie comigo a poesia de Tereza de Ávila, que viveu no século XVI e foi canonizada cem anos mais tarde.

A Cristo crucificado

Não me move, meu Deus, para querer-te
O céu que me hás um dia prometido:
E nem me move o inferno tão temido
Para deixar por isso de ofender-te.

Tu me moves, Senhor, move-me o ver-te
Cravado nessa cruz e escarnecido.
Move-me no teu corpo tão ferido
Ver o suor de agonia que ele verte.

Moves-me ao teu amor de tal maneira,
Que a não haver o céu, ainda te amara
E a não haver o inferno te temera.

Nada me tens que dar porque te queira;
Que se o que ouso esperar não esperara,
O mesmo que te quero te quisera.
domingo, abril 04, 2010 | Autor: Ebenézer Teles Borges
No texto publicado anteriormente (clique aqui para lê-lo), registrei minhas impressões a respeito da leitura do livro "Deus Existe" de Antony Flew. Transcrevo abaixo algumas palavras do próprio autor, extraídas do último capítulo dessa obra.

A ciência, como ciência, não pode fornecer um argumento a favor de Deus, mas as três peças de evidências que analisamos nesse livro – as leis da natureza, a vida como uma organização teleológica e a existência do universo – só podem ser explicados à luz de uma Inteligência que explica tanto sua própria existência, como a existência do mundo. A descoberta do Divino não vem através de experimentos e equações, mas por uma compreensão das estruturas que eles revelam e mapeiam.

Agora, tudo isso pode parecer abstrato e impessoal. Alguém pode perguntar como eu, como pessoa, reajo a essa descoberta de uma suprema Realidade que é um Espírito onipresente e onisciente. Volto a dizer que minha jornada para a descoberta do Divino tem sido, até aqui, uma peregrinação da razão. Segui o argumento até onde ele me levou, e ele me levou a aceitar a existência de um Ser auto-existente, imutável, imaterial, onipresente e onisciente...

Para onde irei agora? Em primeiro lugar, estou inteiramente disposto a aprender mais sobre a divina Realidade, especialmente à luz do que sabemos sobre a história da natureza. Em segundo lugar, a questão sobre se o Divino se revela na história humana continua sendo um válido tópico de discussão. Não podemos limitar as possibilidades da onipotência, apenas excluir o que for logicamente impossível. Tudo o mais é aceitável à onipotência.
[1]

Referência
[1] – Deus Existe, páginas 144 e 145.
domingo, abril 04, 2010 | Autor: Ebenézer Teles Borges
O título acima me remete ao décimo e último capítulo do livro "Deus Existe" de Antony Flew. Pareceu-me que esse título conseguiu captar, de forma concisa, sua atitude e postura atuais, que se contrapõem a sua história de defesa do ateísmo. História essa que se estendeu por mais de cinco décadas e ficou registrada em diversas publicações que lhe renderam popularidade e respeito entre que defendem a hipótese da não existência de Deus. Tal mudança de rumo em sua vida despertou em mim enorme curiosidade, embora não me tenha surpreendido.

Curiosidade porque Antony Flew é conhecido como um dos maiores defensores do ateísmo nos últimos cinqüenta anos; por ser, ele, um grande vulto no campo acadêmico e uma referência em se tratando de apologia ao ateísmo. Fiz a mim mesmo a pergunta que muitos certamente fizeram também: o que o levou a mudar de lado?

A despeito dessa curiosidade, confesso não ter ficado surpreso, porque entendo que as pessoas verdadeiramente sábias tendem a ser igualmente humildes. O sábio, suponho, ciente da dinâmica da existência e das limitações e inconstância do saber humano, admite e presume que a verdade de hoje possa perder esse status amanhã. E em se confirmando essa suposição, ele se dispõe a rever seus conceitos, reavaliar suas idéias, reestruturar sua posição e reformular sua visão do mundo e da realidade. Flew, em minha opinião, se encaixa nesse perfil de sabedoria.

Durante a leitura fica claro que o lema de Flew sempre foi "seguir o argumento até onde ele o levasse". Tal atitude o levou à defesa do ateísmo, sempre ancorado em argumentos racionais, que podem ser lidos nos vários livros e artigos que publicou. Contudo, em dado momento, esse mesmo princípio – o de seguir o argumento até onde ele o levasse – o conduziu a conclusões inusitadas, que o levaram a reconsiderar sua posição, mudar de lado e a declarar publicamente que Deus existe. Julgo importante destacar que essa afirmação não resultou de um "encontro com o Sagrado", mas de uma descoberta de natureza puramente racional.

Não pretendo, aqui, discutir os argumentos apresentados e defendidos por Flew. Reconheço e admito não ter autoridade para concordar ou discordar deles. Não sou filósofo nem cientista. O máximo que posso fazer é emitir uma opinião pessoal que, como qualquer opinião, vale mais para quem a emite do que para quem a lê ou ouve.

Já adianto que tenho grande admiração por aqueles que, consciente e deliberadamente, mudam de posição quando convencidos de que essa é a decisão a ser tomada. É preciso muita coragem para sair da zona de conforto e enfrentar os desafios impostos pela mudança. Essa atitude, por si só, despertou em mim respeito pelo autor e interesse em ouvir o que ele tinha a dizer.

Quanto ao conteúdo do livro em si, gostei da leitura e a recomendo a todos que se interessam por esse tema. Porém, é possível que aqueles que esperam encontrar nas páginas desse livro referências ao Deus cristão se decepcionem um pouco. O Deus em quem Flew passou a acreditar é descrito por ele como "um Ser auto-existente, imutável, imaterial, onipotente e onisciente"[1], até aqui, parecido com o Deus da Bíblia. Mas as semelhanças param por aí. Não encontrei, em seu livro, nenhuma alusão a um Deus pessoal, amigo e interessado nas particularidades da vida de seus filhos. Flew faz questão de afirmar que não acredita em outra vida ou sobrevida ou vida após a morte. Conseqüentemente, não há um céu a buscar ou inferno a temer. Em outras palavras, embora acredite em Deus, seria errôneo de nossa parte presumir que ele tenha se tornado um cristão.

Seja como for, é bom saber que homens como Flew, e outras tantas autoridade do mundo acadêmico citados por ele, fazem parte de uma comunidade crescente de filósofos e cientistas que acreditam na existência de uma Mente Criadora.

Deus existe! É a conclusão a que Flew chegou. Para não me alongar mais, colocarei um ponto final nesta postagem e publicarei , em breve, as próprias palavras dele, extraídas do último capítulo de seu livro, que sintetizam muito bem seu pensamento e posição.

Até mais!

Referência:
[1] Deus Existe, página 144.
quinta-feira, abril 01, 2010 | Autor: Ebenézer Teles Borges
Faz um tempão que não passo por aqui. O blog ficou entregue às moscas. Mas hoje, véspera de feriado, voltei a este espaço, para remover a poeira e abrir janelas e portas, na esperança de que ar puro e luz solar possam entrar e revigorar as páginas deste site.

A vida vai bem, graças a Deus, apesar do ritmo intenso que me deixa quase sem tempo para investir em mim mesmo. Mas hoje, já em clima de feriado, me permiti revisitar este espaço em que, "de texto em texto" vou tecendo pretextos para falar comigo mesmo sobre temas variados.

Amanhã será feriado, graças a Deus, literalmente! Digo "literalmente" porque, de acordo com a tradição cristã, foi há muito tempo e muito distante daqui, numa sexta-feira, que o comum e o extraordinário se manifestaram "em carne e osso" na pessoa de Jesus de Nazaré, transformando a cruz – horrendo símbolo de morte – em forte e significante emblema de vida.

O tempo passou. Uns dois mil anos... Muito tempo! E o tempo, com seu poder corrosivo, deixou sua marca na história desses dois milênios: arruinou impérios, destruiu nações, sufocou povos, apagou fatos, desgastou lembranças e encobriu grande parte da própria história. Curiosamente, a história de Jesus de Nazaré – o homem que era Deus, ou o Deus que era homem – não só resistiu à ação erosiva do tempo como também ganhou força, renovou-se e conquistou milhões de seguidores em todo o mundo!

O que de fato aconteceu naquela longínqua sexta-feira lá "nos páramos da Palestina" (como dizia um velho amigo, de quem guardo lembranças e saudades) não se pode saber ou afirmar com certeza. Mas a fé cristã, fé que metaforicamente se faz certeza naquele que crê, aceita e entende que, naquele dia, o Céu se abriu para conceder à humanidade o maior dos dons: o direito à vida plena e eterna, desfazendo a maldição da morte que pairava, qual sombra sinistra, sobre todos filho de Adão.

Amanhã terá início o feriado de páscoa... graças a Deus! Pretendo fazer bom uso dele.
quarta-feira, agosto 05, 2009 | Autor: Ebenézer Teles Borges
Não dá para falar sobre minhas crenças sem recuar no tempo e regressar a minha infância. Então, vamos lá! Lembro-me muito bem do dia em que meu irmão me surpreendeu com a seguinte pergunta: "Quem é seu maior inimigo?". Hesitei um pouco antes de lhe responder que era o Diabo. "Não!", retrucou, ele, com firmeza e aparente convicção: "seu maior inimigo é o Ego". E eu, que até então desconhecia a existência dessa palavra, não tive outra alternativa senão lhe perguntar quem era esse tal de Ego. A resposta me pareceu sem nexo: "O Ego é você mesmo!". Fiquei pensativo, confuso e resolvi "consultar os universitários", isto é, o meu pai, que confirmou a história: Eu era, de fato, meu maior inimigo!

Nada daquilo fez sentido para mim. Como poderia eu mesmo ser meu maior inimigo? Não percebia em mim essa auto-hostilidade toda, nem me via como uma ameaça dissimulada a mim mesmo. Contudo, vindo de meu irmão e tendo o aval de meu pai, não havia por que discordar e, resignado, acolhi essa nova crença como verdadeira, passando a divulgá-la entre meus amigos.

Esse episódio serve para ilustrar o que me aconteceu reiteradas vezes no passado e que, talvez, possa ter-lhe ocorrido também. Ao longo da vida, dei guarida a muitas crenças cuja única âncora era o testemunho de pessoas em quem eu depositava confiança cega. A lógica por trás dessa minha atitude é de fácil compreensão: se tais pessoas eram de minha confiança, logo tudo que me diziam era confiável, fidedigno, verdadeiro, inquestionável. A vida, no entanto, se encarregou de me abrir os olhos para o fato de que as boas intenções e o cuidado sincero daqueles que nos amam não são salvaguarda inabalável contra o engano.

Por isso hoje, ao tentar falar sobre minhas crenças, faço questão de começar enfatizando algo que você certamente já sabe: eu sou humano e fui educado por humanos. Saliento isso porque nós, humanos, às vezes nos esquecemos que "os outros" também o são. A imperfeição faz parte de nossa natureza e, por conta disso, incorremos em erros freqüentemente. Eu, por exemplo, não posso negar que já falhei diversas vezes na vida e até perdi a conta das muitas escolhas equivocadas que fiz. E não me refiro aqui apenas a erros intencionais, aos quais sempre busquei evitar, mas principalmente àqueles deslizes sutis que cometemos ao tentar acertar!

Com relação as minhas crenças, sempre almejei aquelas que pudessem estampar o selo da verdade. Mais que isso, eu sempre acreditei ter acertado na escolha delas. Mas sou humano e cognitivamente imperfeito. Portanto, posso sim ter me equivocado e albergado crenças falsas.

É por essa razão que me faço a seguinte pergunta: Será que me enganei em crer no que sempre cri? Logo eu, que sempre acreditei que os outros é que estavam enganados?

Admitir essa possibilidade não me foi tarefa fácil ou agradável. Causou-me certo desconforto por ir de encontro à minha natureza. Como todo ser humano, gosto de estar certo sempre, de pisar em solo firme, de me sentir seguro em minhas convicções. Ser-me-ia mais cômodo assumir a autenticidade de minhas crenças e insistir na defesa deles, mesmo que, para isso, fosse necessário fechar os olhos às evidências, distorcer fatos e fazer alguns ajustes na realidade.

Confesso-lhe que por um breve tempo tentei agir assim. Tentei acomodar a realidade aos moldes de minhas crenças. Esforcei-me para "empurrar" o mundo numa determinada direção. Mas falhei... Aprendi uma lição: empurrões honestos e sinceros também provocam acidentes!

Outra lição que aprendi à duras penas é que minhas crenças nunca tiveram o poder de legislar sobre a realidade. Isso mesmo. Minhas crenças, por mais que me parecessem verdadeiras, por mais que me trouxessem conforto e segurança, por mais que me fizessem sentir-me especial, eram apenas crenças, isto é, um palpite vago, uma aposta incerta, um desejo hesitante, uma esperança frágil e trêmula de revestir de sentido essa realidade fria e rude que nos cerca, envolve, fascina, assusta e surpreende.

Que devo, então, fazer com minhas crenças? Desfazer-me de todas elas?

Penso que não. Devo, isto sim, revisá-las com cuidado, atenção, interesse e o máximo de isenção possível, consciente de que nem todas são falsas e nem todas verdadeiras.

Outrossim, devo proceder com humildade e me dispor a abrir mão daquelas crenças que se mostrarem falsas: crenças alienantes, crenças que me distanciam da realidade, que me afastam dos seres humanos, que me induzem a ver a mim mesmo como um ente especial e me instigam a virar as costas para o mundo por julgá-lo vil e mal.

Este mundo, com seus encantos e dores, é nossa casa e devemos nos unir na árdua tarefa de transformá-lo em um lar melhor para todos nós. Eis aí uma bela crença a ser cultivada e incentivada – a crença de que podemos dar as mãos e, juntos, construir aqui mesmo um mundo melhor para todos!
sexta-feira, maio 29, 2009 | Autor: Ebenézer Teles Borges
No princípio era assim: acima de tudo e de todos estava Deus. Com Sua barba longa, cabelos brancos, corpo roliço e barriga avantajada, lembrava-me o bom e velho Papai Noel. Passava a maior parte do tempo acomodado em Seu enorme trono, em divino e santo ócio. Às vezes bocejava. Eu imaginava que, quando lúcido, Suas atitudes se assemelhassem às de meu avô, um velhinho bonachão e divertido que gostava de contar histórias exageradas. E pouco abaixo dEle estavam seus dois filhos, Jesus e Cristo, aos quais Ele delegara a missão de cuidar do Universo.

O primeiro dos filhos, Jesus, sempre trajava vestes brancas e resplandecentes. Seu aspecto era elegante e nobre e trazia no rosto um sorriso cativante e gentil. Vivia cercado de anjos, num lugar idílico, ocupando-se com a nobre tarefa de edificar mansões e construir uma cidade de ouro para nós. Uma vez concluída essa empreitada, Ele retornaria à Terra com pompa e circunstância, acompanhado por legiões de anjos e ao som de trombetas e cantos. Seria um dia de festa! Em seguida nos conduziria ao nosso novo lar, ao paraíso celeste, onde viveríamos em gozo eterno. Eu adorava Jesus. Ele era um dos meus heróis, o maior de todos, o mais forte e bondoso. E eu, como qualquer criança educada nas tradições cristãs, queria estar com Ele, sentar em Seu colo, ouvir-Lhe a voz macia e sussurrar-Lhe aos ouvidos minhas preces inocentes.

O segundo filho, Cristo, era-me uma fonte de muitos tormentos. Sua presença era sempre evocada em situações constrangedoras, quando eu cometia algum deslize. Diziam-me: "Quando Cristo voltar você vai pagar!". Era o bastante para que o medo e a culpa me apertassem o peito e a tristeza inundasse meu coração. Como temia esse Cristo! Quão melhor seria minha vida se Ele não existisse! Ainda me lembro de Seu aspecto sombrio: vestes negras, semblante austero, olhar intimidador, postura ameaçadora, tendo na mão um livro de capa preta no qual anotava todas as minhas falhas e faltas.

O pior é que todo dia eu aprontava uma. Não que eu fosse uma criança insubordinada. De fato era mais bem comportado que a maioria de meus coleguinhas. Mesmo assim incorria em frequentes desvios de conduta: um atrito com outra criança, uma recomendação não seguida, um comportamento inadequado, uma insubordinação aos pais, um sei lá o quê... e lá vinha uma punição e/ou era pronunciada a maldita sentença: "Quando Cristo voltar você vai pagar!". Ah, como esse Cristo me aborrecia! Queria tanto que Jesus acabasse com Ele! Eu orava em segredo pedindo a Jesus que O exterminasse. Mas Jesus era bonzinho demais, até mesmo com Cristo, e o deixava viver e prosseguir me atormentando.

Vivia assim a curiosa experiência de amar a Jesus e odiar a Cristo. O primeiro era meu amigo, o segundo, inimigo temerário. Um era o mocinho, o outro, o bandido. Buscava o colo de um e fugia da presença do outro. Desejava ardentemente que Jesus voltasse, e tremia nas bases só em pensar na volta de Cristo. Quanta confusão em minha cabeça infantil! Confusão essa que só foi desfeita mais tarde, quando me fizeram crer que Jesus e Cristo eram a mesma pessoa. Que alívio! Eu estava enganado!

Mas essa era apenas uma parte da história. Tudo que eu atribuía ao "Cristo mau", muito mais se consubstanciava em um ser inferior e perigoso chamado Diabo ou Satanás. E foi assim, com uns quatro ou cinco anos de idade, que o Diabo apareceu pela primeira vez em minha vida e começou a me rondar.

Meu alívio durou pouco. Descobri que esse tal Diabo era uma ameaça bem maior, além de ser feio de doer: cabeça grande, orelhas pontudas, pé-de-bode, pele encarnada, corcunda, olhar sinistro, boca grande, dentes afiados, língua de cobra... bota feio nisso! Era só eu ficar sozinho ou em lugar mal iluminado que o Capeta se revelava. Que medo! Sentia um frio na barriga e saía em disparada em busca de proteção. Pra piorar, disseram-me que o Diabo não estava sozinho. Sob seu comando havia um monte de diabinhos que fariam de tudo pra me levar para o inferno. E o inferno, que era a cada do Diabo, era um lugar medonho, quente, abafado, com labaredas enormes pra todo lado. Um segundo lá e eu viraria torresmo. Mais um e viraria fumaça. Que horror! O jeito era ficar na luz, me pegar com Jesus e tratar de ser bonzinho pra escapar do Chifrudo.

Não entendia por que Jesus não voltava logo para acabar com o Diabo. Isso ninguém me explicava. Por que Ele estava demorando tanto? Eu estava disposto a abrir mão da mansão de ouro que Ele estava preparando para mim, contanto que Ele me livrasse logo da presença incômoda do Diabo. Mas Jesus não voltava e eu fui crescendo e aprendendo a lidar melhor com meus medos e minhas crenças.

Hoje, enquanto escrevo esse texto, essas lembranças me divertem. Mas naquela época, com tão pouca idade, tudo me parecia muito real e assustador. Minha angústia e sofrimento eram verdadeiros e profundamente dolorosos. Tinha medo da escuridão e dormia sempre com a luz acesa. Por um bom tempo, vivi num mundo assombrado por demônios. Por que será que adultos bem intencionados contam esse tipo de história para crianças?

Enfim, tudo isso é passado. Nada mais que lembranças. Hoje, a forma como vejo a Deus, a Jesus Cristo e ao Diabo mudou bastante. Outra boa notícia é que não temo mais ficar sozinho, nem tenho medo da escuridão. Mas, por precaução, prefiro não assistir a filmes de terror. Vá lá que o Demônio volte...
sábado, maio 23, 2009 | Autor: Ebenézer Teles Borges
Há dias em que não sinto a menor vontade de sair da cama. Não que a cama esteja assim tão boa. É que o que me espera fora dela desanima. Até onde sei essa indisposição pode acontecer (e acontece) com qualquer um, menos com o Super-Homem, que não é deste mundo. E eu, que não sou kriptoniano, me peguei ontem em um desses dias de desencanto e mal-estar.

O motivo? Nada de grave. Nada que você ou qualquer um que já cresceu não tenha experimentado: um probleminha aqui, uma preocupaçãozinha ali, um incômodo acolá. Apenas isso. Nada demais. Coisas de adulto... Em dias assim, sabe-se lá por que, essas coisinhas pequenas tornam-se grandes o bastante para me assustar. E a ansiedade aparece, o desconforto cresce e o rio da vida deixa de fluir com leveza. Melhor seria se pudesse permanecer na cama...


Mas não dá. É preciso levantar, erguer a cabeça e ir à luta. Somos adultos. Descobrim
os que não somos especiais nem estamos imunes aos males que a vida traz. É claro que a vida tem seu lado bom e belo. Sabemos disso. Mas, em dias assim, cinzentos, esse saber não nos consola. Prevalece a falta de ânimo. O corpo padece, a alma entristece e a vida perde o brilho. Dá vontade de voltar a ser criança e escapar dos compromissos e obrigações da vida adulta... E quem nunca se sentiu assim que atire a primeira pedra!

Tenho pra mim que o mundo da criança é bem mais interessante que o do adulto. Ele se apresenta cheio de vida, encanto, vibração e surpresas. É um mundo que se renova a cada instante, que se revigora a cada novo olhar.

O mundo do adulto, por outro lado, afigura-se um tanto sisudo e chato,
cansativo e monótono, enfadonho e repetitivo. Nele, trabalha-se muito, diverte-se pouco e a inocente exploração da realidade cede lugar à tediosa e responsável luta pela sobrevivência. As preocupações aumentam, o vigor físico diminui e a saúde começa a vacilar. O tempo deixa de ser um aliado e o futuro não se mostra mais tão amigo e amistoso quanto antes. Ser adulto não é fácil e nem sempre é bom. Às vezes chega a ser terrível e assustador. É quando, no íntimo da alma, sobrevém o espanto. E o homem se sente inseguro como menino, qual ave que saiu do ninho, sem saber se é capaz de voar.

Quem, alguma vez na vida, não se cansou de ser adulto? Quem nunca sentiu saudades da infância? E quem nunca desejou ter um pai amoroso, protetor e provedor, que assuma a responsabilidade e pague nossas contas? (Penso que tolo é quem não quer ter vida mansa).

Não estou só nesse desejo. E se duvidam, peço-lhes que deem uma olhada nas igrejas. Elas estão aí, em todo canto, em cada esquina. São erguidas do dia pra noite. Proliferam-se como se fossem ervas daninhas, embora não sejam. São flores que desabrocham sob chuvas de bênçãos que descem do céu. Observem-nas: a cada dia estão mais cheias de fiéis, pessoas que, cansadas da luta, buscam alívio nas promessas de prosperidade aqui e na esperança de facilidades futuras. Almejam ir para o Céu, um lugar especial no qual doenças não entram, tristezas não há, também não há contas a pagar, nem trabalho extenuante, nem rotina enfadonha, e muito menos adultos... Isto mesmo. No céu não há adultos, apenas crianças. Lá seremos todos inocentes e felizes. E teremos asas, como anjos e pássaros, com as quais poderemos voar sem medo.

Com efeito, o céu é um lugar destinado a crianças. Lá adulto não tem vez. É o que diz a Bíblia (S.Mateus 19:14). Nicodemos, um adulto, não estava credenciado a entrar nele a menos que renascesse como criança (S. João 3:3). Está escrito: "Se não ... vos tornardes como crianças, não entrareis no Reino dos Céus" (S.Mateus 18:3).

E ao que me parece, as igrejas estão interpretando esses textos ao pé da letra. Estão tentando transformar adultos em crianças. Tarefa difícil, senão impossível. Mais fácil é condicioná-los à agirem de modo infantil. E nisso elas estão logrando êxito. Duvidam? Então vou lhes dar um exemplo de aluno dedicado e que foi até elevado ao status de "santo", S. Inácio de Loyola, fundador da Companhia de Jesus (os jesuítas). Ele afirmava e testemunhava da mudança que lhe ocorreu com as seguintes palavras: "Acredito que o branco que eu vejo é negro, se a hierarquia da igreja assim o tiver determinado" [1]. Pronto. Virou criança!

Sinceramente, gosto de criança, mas adulto com comportamento infantil me enoja.


E retornando ao incidente que motivou esse texto, ontem acordei desmotivado, sem disposição para encarar os compromissos do dia. Senti até o desejo de voltar a ser criança, de poder não ser responsável, de deixar que outros decidissem tudo por mim. Mas ainda ontem, ao me lembrar do exemplo desse "santo", percebi o quão feio é ser pueril depois de já ter crescido. Se para ser santo é preciso agir assim, contento-me em permanecer pecador. Se ser criança é proceder dessa forma, prefiro continuar adulto.

Não pretendo abrir mão de meu discernimento, de minha capacidade cognitiva, da faculdade de pensar, da liberdade de escolher, acertar ou errar. Sei que renúncia ou negação não fará de mim uma criança, e sim um imaturo. Sei também que ser adulto não é fácil e nem sempre é bom. Mas, mesmo assim, estou decidido a continuar agindo como tal.

E você, o que decide?




Referências:
quarta-feira, abril 29, 2009 | Autor: Ebenézer Teles Borges
Era uma vez um sapo. Mas aquele não era um sapo qualquer, era um príncipe. Uma bruxa malvada lançou sobre ele uma maldição: palavras mágicas infectadas de poder malévolo transformaram o humano de sangue azul em anfíbio de sangue frio. Quanto poder nas palavras!

Eu era uma criança e, em minha inocência infantil, ficava fascinado com o poder das palavras que, na boca de uma classe privilegiada, transcendiam a esfera dos símbolos, ganhavam densidade e se realizavam no mundo objetivo. Perguntava-me, num misto de admiração e temor, se tais seres como bruxas, feiticeiros, encantadores, magos, adivinhos, videntes e profetas realmente existiam. Acreditava, isto sim, que acima deles, numa esfera elevada e inatingível, existia um Ser único e supremo em quem a palavra tinha o dom de se manifestar com força incomparavelmente maior e em proporções muito mais surpreendentes. Num passado distante, num tempo em que nem mesmo o tempo existia, esse Ser fez uso da palavra para dar conteúdo ao vácuo e, do nada, trazer tudo à existência. Está na Bíblia: "E disse Deus: Haja... e houve." (Gênesis 1:3).

Mesmo hoje, quando minha infância há muito se fez saudade, continuo a me surpreender com poder "mágico" das palavras, às quais recorremos com frequência como instrumento de ação, interação e coação. Por meio da palavra, agimos sobre os outros com incentivos, promessas, elogios, bajulações, mentiras, imprecações, insultos, ofensas e muito mais. E ao assim agirmos – ora exaltando, ora aviltando mediante palavras – é como se, por meio delas, ainda fôssemos capazes de transformar sapos em príncipes e príncipes em sapos.

E é aqui que começo a sentir certo desconforto, sobre o qual me permito falar em poucas palavras. Sinto-me dominado pela forte impressão de que nossa relação com as palavras às vezes se torna promíscua. Os dicionários definem "promiscuidade" como uma "mistura confusa" [1]. Desconfio que, sob condições que não me são claras, usamos a palavra pra criar uma espécie de realidade virtual dentro da qual nos sentimos mais confortáveis. Essa desconfiança ganha força sempre que ligo a TV e me deparo com programas religiosos nos quais reverendos, pastores, padres e apóstolos usam e abusam de palavras em rituais e cultos. Preces longas e invocações veementes são pronunciadas com fervor, evocando forças misteriosas capazes de manipular as leis da natureza. E são tantos e tão frequentes os milagres que supostamente acontecem que me pergunto se aquilo é ficção (fantasia) ou realidade. Não me parece que eu e eles vivemos a mesma realidade.

Permitam-me fazer uso de uma ilustração. Todos nós conhecemos bem um semáforo. Trata-se de um instrumento usado para controlar o tráfego de veículos e que faz uso de uma linguagem bastante simples, composta por três sinais luminosos nas cores verde, amarela e vermelha. A cada uma dessas cores está associado um significado: avançar, atenção e parar. Frequentemente vemos automóveis parando quando o semáforo emite um sinal vermelho e avançando quando o sinal está verde. Sabemos que não há nada de mágico ou sobrenatural no semáforo. Temos plena consciência de que a cor vermelha emitida por ele não possui o poder intrínseco de frear um caminhão. Ela é apenas um signo, um sinal, que o motorista interpreta como "pare!".

Parece simples, mas nem sempre nossa percepção é tão clara. Às vezes nos comportamos como se a palavra (o vermelho do semáforo), na boca de nossos guias, possuísse poder sobrenatural capaz de frear acontecimentos ruins ou mover o Universo em nosso favor. Movidos por essa crença, fechamos os olhos (e possivelmente a cabeça) quando eles oram invocando chuva, cura de moléstias, manutenção da saúde, advento de fortuna e, em alguns casos, a ruína e a morte dos inimigos.

Se ainda fosse criança eu acreditaria em tudo isso... Mas cresci. Hoje, bruxas e feiticeiros já não me metem medo, embora ainda me assombre com o poder das palavras, pois sei que, quando combinadas na dose certa, elas podem ser um sopro de vida ou uma lufada de morte. Usá-las, contudo, para transformar príncipes em sapos (ou coisas do gênero) me parece fantasia da qual gente grande deve desconfiar.


Referências
[1] Houaiss - verbete "Promiscuidade" - http://houaiss.uol.com.br/busca.jhtm?verbete=promiscuidade&stype=k

segunda-feira, fevereiro 23, 2009 | Autor: Ebenézer Teles Borges
O título desta postagem foi extraído de um artigo publicado pela Folha de São Paulo em 22/02/2009. O autor é o conhecido brasileiro e professor de física teórica Marcelo Gleiser.

Reproduzo, abaixo, partes desse artigo (destacando alguns pontos em negrito). Mais abaixo, disponibilizo links para aqueles que desejam ter acesso ao texto na íntegra.

"Como escrevi em colunas recentes, neste ano celebramos dois grandes aniversários. O primeiro, o bicentenário do nascimento de Charles Darwin e o sesquicentenário da publicação de seu revolucionário "A Origem das Espécies". O segundo, os quatrocentos anos da publicação do livro "Astronomia Nova", em que Johannes Kepler mostrou que a órbita de Marte é elíptica, inferindo que todas as outras seriam também. No mesmo ano, 1609, Galileu Galilei apontou o seu telescópio para os céus mudando a astronomia para sempre.

Em ambos os casos, as descobertas científicas criaram sérios atritos com as autoridades religiosas. Atritos que, infelizmente, sobrevivem de alguma forma até hoje, principalmente com as religiões monoteístas que dominam o mundo ocidental e o Oriente Médio: judaísmo, cristianismo e islamismo. O momento é oportuno para iniciarmos uma reavaliação das suas causas e apontar, talvez, resoluções. (...)

O mundo mudou, a sociedade mudou, a religião também deve mudar.

Insistir na rigidez da ortodoxia é condenar a congregação a viver no passado, numa realidade incompatível com a sociedade moderna. Se o pastor ou rabino ortodoxo tem câncer e recebe terapia de radiação, ele deve saber que é essa mesma radiação que permite a datação de fósseis com centenas de milhões de anos. É hipocrisia aceitar a cura da radiação nuclear e ainda assim negar os seus outros usos.

Fechar os olhos para os avanços da ciência é escolher um retorno ao obscurantismo medieval, quando homens viviam suas vidas assombrados por espíritos e demônios, subjugados pelo medo a aceitar a proteção de Deus. A escolha por uma devoção religiosa - se é essa a sua escolha - não deveria ser produto do medo."

Para mais detalhes acesse:

1. Folha de São Paulo: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe2202200902.htm
2. Reprodução do mesmo artigo no site da IHU - http://www.unisinos.br/ihu/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=20170
terça-feira, janeiro 20, 2009 | Autor: Ebenézer Teles Borges
O soneto, transcrito no final deste texto, é um dos meus favoritos. Nele, o poeta – homem, mortal e pecador – se expressa em forma de prece, como se tentando despertar para o diálogo aquele que lhe é superior – Deus, eterno e perfeito. O homem precisa de Deus, disso o poeta é ciente. Mas a recíproca não é igualmente verdadeira?

No início do soneto, Gregório de Matos Guerra assume a postura de um crente reverente e submisso, mas por pouco tempo. Logo ele se põe a argumentar com Deus, numa demonstração de racionalidade que uns interpretam como lucidez e outros como loucura. Seja como for, é notável sua ousadia, especialmente em se tratando de um homem que viveu sob os rigores do Brasil Colônia (século XVII).

Nos primeiros versos o poeta se reconhece como pecador, não por sua descrença, falta de fé ou por ações reprovadas pelo clero. "Pecar", segundo ele, é atitude inerente ao ser humano. Mais que isso, é condição sine qua non para que o homem seja de fato humano. Por outro lado, "perdoar" é próprio da natureza de Deus, de modo que e é no exercício do perdão que toda a Sua glória e divindade se manifestam.

Gregório enxerga aí uma certa cumplicidade entre homem e Deus, pois essas características (pecar e perdoar) os mantém ligados ao gerar, a cada pecado humano, uma nova necessidade de perdão divino. Conseqüentemente, quando mais humano se é, mais divino Deus terá a oportunidade de ser.

Esse argumento faz sentido? Para um teólogo talvez não; para o poeta, muito provavelmente sim.

Fico imaginando a cena: vejo o poeta em seu quarto modesto para os padrões atuais. É noite e ele acende o lampião. Uma luz oscilante e pálida toma conta do ambiente, delineando silhuetas e formas. Com o lampião na mão ele avança lentamente em direção a uma velha mesa onde costuma passar horas trabalhando, refletindo, dando aos sentimentos e inquietações a forma de poesia e prosa. Subitamente, sua atenção é despertada pela dança sutil das sombras que alguns objetos inertes projetam ao serem tocados pela trêmula luz em movimento. Esse jogo entre luz e sombras lhe serve de inspiração e ele exclama para si mesmo: "Não há luz sem trevas, assim como não há dia sem noite... Riqueza e pobreza, força e fraqueza parecem estar interligados... Não há reino sem súditos, assim como não existe pai sem filho... Como poderia haver Deus (perfeito) sem o homem (imperfeito)?". E conclui: "Não, não é possível. Deus precisa de mim tanto quanto eu dEle. Sem EU não há TU".

E tendo feito essa descoberta (continuo imaginando), ele prossegue no jogo, de maneira consciente e ousada. Não pede perdão; negocia. Não se vê mais em posição de inferioridade e sim de igualdade, afinal, é cúmplice de Deus, parceiros num mesmo jogo. E concluindo, nos últimos versos, ele se supera ao insinuar que Deus tem a obrigação de perdoá-lo, sob pena de ter Sua glória ameaçada.

Esse Gregório é demais!

Segue o soneto, cujo título é "A Jesus Cristo Nosso Senhor".

Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado,
Da vossa piedade me despido,
Porque quanto mais tenho delinqüido,
Vos tenho a perdoar mais empenhado.

Se basta a vos irar tanto um pecado,
A abrandar-nos sobeja um só gemido,
Que a mesma culpa, que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.

Se uma ovelha perdida, e já cobrada
Glória tal, e prazer tão repentino
vos deu, como afirmais na Sacra História:

Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada
Cobrai-a, e não queirais, Pastor divino,
Perder na vossa ovelha a vossa glória.


Referências:
[1] Gregório de Matos Guerra - http://www.biblio.com.br/conteudo/GregoriodeMatos/GregoriodeMatosGuerra.htm
sexta-feira, junho 27, 2008 | Autor: Ebenézer Teles Borges
O significado de uma palavra não deve ser uma coisa para mim, e outra para você. Se assim for, a palavra deixará de nos ser útil, pois não servirá para comunicar um conceito. Quando enuncio a palavra "amor", por exemplo, espero despertar em você o mesmo sentimento de afeição, ternura e profunda ligação para com o objeto amado que sinto em mim ao ouvi-la. Bem sei que a relação semântica entre um símbolo (a palavra) e seu significado (aquilo que a palavra quer dizer) costuma ser afetada pelo contexto de uso. Por isso, nestas divagações pueris sobre o amor, procuro me restringir ao contexto religioso cristão, tão comum a mim e a tantos outros.

Uma das primeiras definições de amor de que me lembro é derivada das páginas da Bíblia. Uma frase curta, forte e de fácil assimilação: "Deus é amor" (I João 4:8). Nunca mais a esqueci. Essa afirmação, embora sucinta na forma, se agiganta em mistérios. Mistérios que hoje despertam em mim mais dúvidas que certezas. Pra começar, de que deus estamos falando? A Bíblia cita vários, dentre os quais Astarote, Renfã, Dagom, Adrameleque, Nibaz, Asima, Nergal, Tartaque, Milcom, Renfã, Marduque, Baal. Qual desses devo tomar como expressão máxima do amor? Nenhum, é o que responde minha essência cristã. Esses aí são deuses falsos, extintos, que não resistiram à ação corrosiva do tempo. Deus bom é deus vivo. A Bíblia é clara ao identificar o Deus verdadeiro (com "D" maiúsculo) como o Deus vencedor, vivo e eterno. Esse Deus é aquele que abençoava Israel no passado e que hoje acompanha, protege e guia seus novos filhos, os cristãos. Assumindo essa premissa como verdadeira, a próxima pergunta é: o que posso entender sobre o amor ao estudar os atos desse Deus na história humana?

Folheando as páginas da Bíblia, não é difícil constatar que o amor divino está associado a alguma forma de sacrifício, o maior dos quais se observa na vida de Jesus. De fato, a mensagem central do Novo Testamento é que Jesus morreu pelos nossos pecados. Que incrível! O homem pecou e deveria morrer, mas Jesus assumiu o nosso lugar. Sacrificou-se. Isso é amor. Por outro lado, posso fazer uma leitura diferente dessa mesma história e concluir que Deus exigiu um sacrifício e que só depois de um inocente ter sido humilhado, torturado e morto de forma cruel é que Ele se permitiu demonstrar-nos amor na forma de perdão. Em outras palavras, Deus manifestou seu amor ao exigir e concordar com o sacrifíco de seu próprio filho. Devo confessar que jamais interpretaria esse ato como expressão de amor se não o tivesse lido na Bíblia! Que estranha forma de amar! Deus deve ser o único pai que submeteu o filho à morte e é venerado por isso. Qualquer outro seria tratado como psicopata. Em vista disso, faço-me a seguinte pergunta: Devo amar os outros da mesma forma como Deus amou a seu filho? Devo, em alguma situação especial e por amor a outros, sacrificar aqueles que são do meu lar, do meu sangue, da minha essência?

E por que Deus teve que nos amar sacrificando o seu único filho? Por que Jesus teve que morrer? A Bíblia responde: porque o primeiro homem, uma criação divina chamada Adão, pecou, isto é, desobedeceu a Deus ao provar de um fruto. De que fruto estamos falando? Do fruto do conhecimento do bem e do mal. Vamos relembrar esse episódio.

Antes de comer desse fruto, Adão vivia num paraíso, em inocente felicidade. Penso não estar agredindo o texto bíblico ao afirmar que Adão era um ignorante (por "ignorante" não o estou caracterizando com grosseiro ou mal-educado, e sim como uma pessoa pura, sem malícia, inocente, inexperiente, que desconhecia a existência de algo, que não estava a par de algumas coisas). Certo dia, Deus resolveu testá-lo. Dou-me aqui a liberdade de imaginar uma conversa entre Deus e o primeiro homem:

"Adão", disse Deus, "não queira saber o que é certo ou errado, apenas obedeça. Eu bem sei que você ainda não sabe o que é certo ou errado e, portanto, ainda não sabe que é certo me obedecer. Mas o que está em jogo aqui não é o saber, e sim o obedecer. Portanto eu lhe ordeno: não experimente o fruto do conhecimento. Ah, e antes que eu me esqueça, a árvore que produz esse fruto é aquela que se encontra bem no centro deste jardim. Fui claro?"

E Adão lhe responde: "Sim, o Senhor foi bastante claro. Ensinou-me algo sobre esse fruto. Já não me sinto tão ignorante. Sei pra quê esse fruto serve. Sei que ele é diferente dos demais. Também conheço o local exato em que posso encontrá-lo. Agradeço-lhe por essas informações preciosas". Após essa diálogo, Adão não hesitou em buscar mais: comeu e conheceu. Comeu e pecou. Inconformado com a desobediência do homem, Deus o expulsou do paraíso e hoje estamos aqui, amargando as conseqüências do pecado de Adão. Por razões que desconheço, a única solução para o pecado de Adão seria a morte vicária de um ser puro, o próprio filho de Deus, Jesus. Apenas o amor de Deus não seria suficiente para nos perdoar. Alguém teria que ser sacrificado.

Ao relembrar essa história, sinto-me induzido a crer que todo o mal existente em nosso mundo nasceu da desobediência e, portanto, a submissão pode ser a resposta. Se assim for, alguns religiosos devem estar certos ao insistirem tanto na obediência cega e resistirem com teimosia aos avanços do saber científico. É que, para esses religiosos, o homem foi criado para a obediência, e não para o conhecimento. Ele deve obedecer a Deus prontamente e, na ausência dEle, ao clero que o representa. Mas é preciso cuidado: não se deve obedecer a qualquer clero, e sim ao clero verdadeiro.

De volta ao tema "amor" – amor que ainda entendo como sentimento de afeição, de bem querer, de ternura, de zelo e cuidado por aquele a quem se ama – me pego a questionar o amor daquele que é puro amor. Seria um sacrilégio da minha parte? Talvez... E aqui confesso que, assim como uma mariposa é seduzida pelo brilho da luz, sinto-me atraído pelo magnetismo irresistível que emana do fruto do conhecimento. Herdei essa atração mórbida de meu pai Adão e, à semelhança dele, vivo comendo, ou melhor, cometendo o mesmo pecado.

Pra minha sorte, Deus é amor e planejou um meio de me resgatar. A fórmula é simples: preciso aprender a amar de verdade. E em matéria de amor, não há exemplo melhor que o próprio Deus. Portanto, devo amar como Deus amou a seu filho, sacrificando-lhe a vida em prol de criaturas ínfimas esculpidas em barro... Devo amar da mesma forma como Deus ama aqueles a quem condenará ao sofrimento eterno por não acreditarem ou não aceitarem o seu amor.... Devo amar da forma como Deus diz que me ama e me protege, mesmo sabendo que ele não poupou do sofrimento e morte o seu próprio filho... Confesso estar confuso diante desses exemplos incomuns de amor divino.

Essa confusão, contudo, tende a se dissipar se eu reconhecer minhas limitações acerca do caráter e amor do Criador. Sou finito. Limitado. Minha mente é pequena demais para entender os misteriosos atos de Deus. O que a mim parece loucura, na verdade, é a maior prova de amor já demonstrada neste Universo. Minha reação confusa depõe contra mim mesmo ao expor minha ignorância e estupidez.

A Biblia deve estar certa. Deus é amor e eu sou um tolo. Reconheço e assumo aqui a minha ignorância. Também preciso reconhecer que, à semelhança de meu pai Adão, provei do fruto proibido e fugi de Deus. Estou escondido. Não me movo. Temo ser descoberto. Adão fugiu por se sentir nu e eu por estar amedrontado com o assombroso jeito divino de amar. Prefiro o amor mais simples, mais comum, mais humano. Amor de pai, de mãe, de irmãos, de amigos... Companheirismo, atenção, proteção, amparo... Ver, ouvir, falar, sentir, tocar... sem medo...

E assim, assutado, permaneço escondido, como se fosse Adão, atrás de uma figueira...



terça-feira, junho 17, 2008 | Autor: Ebenézer Teles Borges
Acabei de ler a poesia inquietante "Eu Acreditava em Papai Noel" publicada no blog "Convictos ou Alienados". Penso que tenha captado a intenção do autor e entendido a mensagem que ele se propôs a passar. Mesmo assim, resolvi me fazer de néscio e sair em defesa do Bom Velhinho. Por isso afirmo em alto e bom tom: Eu acredito em Papai Noel!

Acredito, sim! É verdade, não nego. Acho até que, de certo modo, ele é mais real que eu. Quantas pessoas me conhecem? Quantas sabem que eu existo? Mas a despeito da ignorância de muitos, eu existo, sim. Isto é, penso que existo – Penso, logo existo!

E se eu – esse tão desconhecido – existo, o que dizer do popular Papai Noel? Todos sabem até mesmo onde ele mora: num lugar encantado, mágico, lá no longínquo Pólo Norte. Nunca estive lá e não o conheço pessoalmente, mas desconfio que seria capaz de reconhecê-lo, se os destinos nos fizessem cruzar o mesmo caminho.

Uma das coisas que mais aprecio no Papai Noel é que ele nunca muda. Hoje vivemos num mundo tão descartável! Tudo muda o tempo todo! Mas com o Papai Noel é diferente. Ele é o mesmo ontem, hoje e amanhã. Desde que o conheci, nada mudou: o mesmo uniforme vermelho, a mesma barba branca, a mesma barriga saliente, a mesma risada inconfundível – hou,hou,hou!

Daqui a uns cem anos eu certamente não estarei mais aqui. A vida é curta, efêmera, fugaz. Tentando ser poético, eu diria: "quando penso que sou, fui". Mas imagino que nos próximos cem anos (quem viver, verá) o Bom Velhinho ainda estará por aqui, vivo e imutável no imaginário infantil, presente e atuante nas propagandas e festividades natalinas.

Diante de tantas evidências, não consigo entender por que alguns céticos teimam em duvidar da existência do Papai Noel!

Mas, sendo honesto, devo confessar que algo mudou em mim. O encanto se foi. A magia se perdeu. Que pena... É como se tivesse sido despertado de um sonho encantado, um sonho do qual sinto saudades. O que aconteceu? A responsta é simples: Deixei de ser menino. Virei adulto. Tenho muitas contas pra pagar e pouco tempo pra sonhar. Conseqüentemente, o Papai Noel foi ficando cada vez mais distante...

Constatei, por fim e para meu desencanto, que o Papai Noel existe numa dimensão diferente desta em que vivo, estudo, trabalho, sofro e sonho. Lá, nessa dimensão distante e especial, ele é muito poderoso: conhece todas as crianças do mundo; é capaz de responder às orações, ou melhor, às cartinhas daquelas que nele acreditam; é veloz o bastante para circundar o planeta nas noites de Natal, distribuindo presentes, e por aí vai. Que velhinho poderoso e cativante! Adoro o Papai Noel. Bom seria se ele pudesse se mudar desse plano literário-folclórico em que existe e viesse para a dimensão material-humana na qual estou.

Seria possível essa mudança de dimensão?

Acho difícil. Talvez impossível. Mas nem por isso ouso negar a existência do Papai Noel. Sei que ele está lá, em algum lugar, nas historinhas infantis, no folclore natalino, nas lembranças empoeiradas que preservo de minha infância distante e feliz, no coração de milhares de crianças que continuam a escrever-lhe cartinhas impregnadas de amor e esperança...

Eu ainda acredito em Papai Noel!

domingo, junho 15, 2008 | Autor: Ebenézer Teles Borges
A vida tem que fazer sentido. Não posso ser produto do acaso. Meu cérebro – tão complexo e poderoso – não pode ter sido elaborado por combinações aleatórias ao longo de milhões de anos. Definitivamente, não! Tem que existir um artífice que agiu, movido por um belo propósito. Logo, a descoberta desse propósito e o entendimento, ainda que parcial, das intenções desse ser criador pode e deve dar sentido à minha vida. Então, devo buscar por esse criador. Ele existe sim e, em sendo inteligente, deve ser também inteligível. Talvez até me tenha criado exatamente para isso: para procurá-lo, encontrá-lo e, quiçá, estabelecer com ele uma relação familiar na qual lhe serei como filho e ele me será como pai... Não sei por que esse suposto ser criador desejaria estabelecer comigo tal relação, mas não quero e nem posso pensar nisso agora. Tenho outra questão mais importante e já priorizada a ser tratada: encontrar-me com ele o quanto antes e conhecê-lo bem. Não reside nessa busca e nesse encontro o sentido de minha existência?

Claro que sim, responderá prontamente a mente religiosa. A religião, nas palavras de Rubem Alves, "é o esforço para se pensar a realidade a partir exigência de que a vida faça sentido". Exigência? Sim. A religião exige, reivindica como direito, determina, impõe, preceitua e prescreve: "A vida tem sentido! A vida tem sentido! Não estamos aqui por acaso e sem missão. Somos todos importantes!" E a percepção dessa importância nos tranqüiliza...

Contudo, não posso olvidar que a fé religiosa, por mais forte que seja ou pareça, não tem o poder de legislar sobre a realidade. Por conseguinte, é sensato supor que, fora da limitada e confortável atmosfera criada por ela, pode existir um Universo sem coração, indiferente ao drama humano, insensível às nossas dores, que não conspira contra ou a favor da nossa espécie, que não ouve nossas preces e que não veio a existir movido por propósitos e intenções definidos. Talvez não exista um Criador a ser buscado. Talvez até exista, mas não seja condizente com a imagem paternal e bondosa que dele temos. Talvez exista e até seja paternal e bondoso, mas não onipotente e onisciente... Talvez se assemelhe àquele cientista bem intencionado e dedicado, chafurdado em pesquisas, escondido num laboratório, lançando mão de cobaias e conduzindo experimentos que, talvez no futuro, possam trazer-lhe alguma realização ou benefício...

Mas a mim, tal perspectiva se mostra, por demais, desagradável. Não quero aceitá-la. Não vou aceitá-la, porque, com ela, o meu Ego não se identifica. Meu Ego se sente melhor e mais confortável dentro do cenário colorido e planejado, concebido pela visão religiosa cristã. Meu Ego não quer e não aceita ser aniquilado. Exige a existência de algo mais – um outro Universo, um outro mundo, uma outra vida, o mesmo Ego. Meu Ego precisa de um Deus poderoso o bastante para dar-lhe vida e realizar-lhe o desejo de ser eterno e divino. Por conta disso – desse meu insistente egoísmo – ainda não renunciei à velha busca religiosa pelo sentido da vida. Por isso insisto em lidar com o Universo e com a natureza da mesma forma pessoal com que lido com os seres humanos: com promessas, alianças, pedidos, negociações e algumas bajulações – sempre buscando identificar propósito inteligente por trás de cada acontecimento. E me pego fazendo perguntas infantis e tolas. E me vejo a indagar se as tempestades e tornados, os terremotos e maremotos, as doenças e pestes, os nascimentos e mortes fazem parte de algum plano cósmico. E tento encontrar nesse quebra-cabeça confuso um lugarzinho seguro onde o meu Ego possa, enfim, existir em paz, para sempre...

Seria bem mais simples se eu tão somente abrisse mão desse meu egoísmo... Poderia, como recomenda os orientais, despojar-me de minha identidade, relaxar e me deixar perder como uma gota no imenso oceano da existência...

Resisto firmemente a essa sugestão. Sou egoisticamente apegado à busca religiosa, o que me leva a perguntar se meu grande inimigo é esse tal Diabo, a quem nunca vi, ou se é esse Ego teimoso, o qual nunca deixei de ver...
segunda-feira, junho 09, 2008 | Autor: Ebenézer Teles Borges
Fé, palavrinha corriqueira de efeito raro; pequena na forma, grande na pretensão - monossílabo que move montanhas! Não sei o que é fé; sei o que são montanhas.

Montanhas, conheço-as bem. Meus pais moraram na Serra da Mantiqueira, no sul de Minas. Saudades... Hoje, vou com freqüência ao litoral, transpondo a majestosa Serra do Mar. Nesta serra, a engenharia humana escavou extensos e formidáveis túneis, mas as montanhas ainda estão lá – firmes, imponentes, impassíveis.

Não sei o que é fé. Sei, sim, o que são montanhas.

Já tive a oportunidade de conviver com pessoas detentoras de fé. Diferentemente de mim, tais pessoas pareciam possuir a capacidade de ver o invisível e tocar o intangível. Pus-me, então, a observá-las, na esperança se ser agraciado com fé semelhante.

O tempo passou... Não sei se observei o bastante. É possível que, além de me faltar fé, faltou-me também paciência...

O que pude constatar é que essas pessoas, que me pareciam ter fé, diziam confiar em Deus, na esperança de que tudo desse certo. Porém, ficavam "vigiando" como se nEle não confiassem.

Seria isso fé? Não sei. Estou confuso.

Alguns dicionários definem fé como "confiança absoluta em alguém ou em algo". Essa confiança absoluta, devo confessar, não enxerguei naqueles que, por algum tempo, observei.

Mas não descarto a possibilidade do problema residir em mim, e não neles. Sofro de miopia física e uso lentes corretivas. Talvez também sofra de igual enfermidade no campo espiritual...

Enfim, não sei o que é fé... Talvez também não saiba o que são montanhas...

Referências:

1. Imagem Inicial - Dedo de Deus, na Serra do Órgãos

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